Lúcio Flávio e Lívia Braz, da Agência Brasília | Edição: Carolina Lobo
Reformas e dignidade
De acordo com o diretor da Subsecretaria de Mobiliário Urbano da Secretaria de Governo, Renan Muniz Gonçalves, a reforma das feiras do DF é um trabalho realizado em conjunto pela Novacap, secretarias das Cidades e de Governo, administrações locais e associações dos feirantes.
Entre os trabalhos de manutenção, recuperação e melhorias de 14 desses espaços estão a reforma dos banheiros, padronização das pinturas das bancas e das fachadas, reparos nas instalações hidráulicas e elétricas. Depois de entregar para a população e feirantes as feiras do Gama, Riacho Fundo, Riacho Fundo II, Candangolândia, Taguatinga e Sobradinho reformadas, devem ser devolvidas ainda este ano as de Sobradinho II, Ceilândia e Samambaia.
“Quando a gente fala em feira, até por uma concepção histórica, pensa que é um lugar bagunçado e desorganizado, mas não. Nós trabalhamos para reformar esses espaços para dar dignidade, melhores condições de trabalho, além de estímulo para os feirantes e usuários”, pondera Renan Muniz. “Nossa preocupação era com quem trabalha nas feiras e também com os clientes”, finaliza.
Culinária brasileira
Paraíso dos mais diversos produtos, as feiras ganham a clientela, no dia a dia, sobretudo pelo paladar, na oferta de um rico cardápio que agrega sabores, temperos e gostos de várias partes do país. É a síntese da culinária brasileira reunida em um só lugar. Um caldeirão social bem curtido que o paraibano do sertão de Coremas José Aldy Leite, 55 anos, conhece muito bem. Especialista em comida nordestina e com mais de 30 anos de DF, ele dá a receita do sucesso culinário no tradicional point.
“O carro-chefe é a comida nordestina, que é tradicional da feira de Ceilândia. Aqui nós trabalhamos com muita qualidade e tradição, são comidas feitas com muito carinho”, garante. “Grande parte da clientela é nordestina, que chega aqui realmente para resgatar as raízes, matar a saudade, sentir o sabor novamente da comida típica da sua terra”, sentencia.
A principal atração do quiosque do Zé Aldy, como em quase todas as bancas de comida da Feira Central de Ceilândia, são receitas como sarapatel, dobradinha, buchada de bode, galinha caipira, costela, rabada, carne de sol, baião de dois e, claro, o tradicional mocotó. Iguaria feita com as extremidades do boi, ou seja, as patas cozidas sem o casco, o prato ganhou mais destaque após a covid-19. Tudo graças a um ingrediente milagroso embutido no alimento.
“A procura tanto pelo mocotó quanto pela dobradinha disparou muito porque são comidas ricas em uma proteína chamada colágeno”, explica Francinaldo Pinho, 48 anos, proprietário de outra banca na mesma feira bastante procurada pela clientela. “Ela vai direto para a pele, para os ossos, o cabelo, importante para fortalecê-los. Vem muito idoso aqui pegar porção de mocotó por causa disso”, conta ele.
Morador de Águas Claras, o servidor público e músico carioca Paulo Thirso, 41 anos, gosta de fazer turismo pelas feiras do DF. Ele tem um carinho especial pela da Ceilândia. “Porque é um lugar barato e justo, aqui a comida não é cara e com um nível de qualidade muito grande”, avalia. “Fora isso, gosto do ambiente, do cheiro, de conversar com a galera, e a feira de Ceilândia oferece tudo isso.”
Temperos e ervas
Inaugurada oficialmente em 1984, a Feira Central de Ceilândia, que chega a receber uma média de 11 mil pessoas só no fim de semana, nasceu da fusão de três espaços similares que existiam espalhados pela cidade. A ideia de centralizar o acesso ao local no coração da região administrativa, próximo à mítica caixa d’água, nasceu dos próprios feirantes, que vendiam em bancas rudimentares, mas já com produtos variados como carnes, peixes, queijos, verduras, frutas, artigos de moda, bolsas, sapatos, entre outros atrativos.
Um desses comerciantes foi a mãe da vendedora Simone Dias, 40 anos, dona de uma banca de temperos e ervas no local. Num cantinho marcado por cheiro inebriante é possível encontrar uma rica variedade de condimentos e relvas que desafia a imaginação da clientela, como plantas exóticas para atrair maridos e, pasmem, espantar bruxas.
“Minha mãe começou aqui quando era de lona mesmo, foi uma das pioneiras”, diz orgulhosa. “O nordestino gosta muito desse tipo de comércio e, como a cidade tem muita gente dessa região, a feira foi crescendo mais e mais com o boca a boca. Essa feira é bem nordestina mesmo”, resume.
Feirante há 35 anos em Ceilândia, Dinah Cardoso, 61 anos, fala sobre a credibilidade e a confiança conquistadas na Feira Central de Ceilândia graças aos produtos que vende na sua banca. Delícias como queijos e requeijões mineiros e doces nordestinos fizeram a clientela mudar, inclusive, de hábitos. “Antes, muita gente tinha que encomendar os produtos, que vinham de avião, carro. Agora eles encontram tudo aqui”, orgulha-se.
Além de queijos fresquinhos e requeijão, quem fizer um pit stop no quiosque da Dinah vai encontrar agrados como manteiga de todos os tipos, petas, rapaduras, doces variados tradicionais do Nordeste. “Tem coisas que não adianta ir no mercado, só encontra aqui na Feira Central de Ceilândia”, avisa.
Feira do Produtor de Vicente Pires
Com 27 anos de existência, a Feira do Produtor de Vicente Pires nasceu da necessidade de dar vazão às verduras e frutas produzidas pela colônia agrícola da cidade. Hoje abriga também pequenos agricultores vindos de Taguatinga e Águas Claras. Pessoas como a feirante Célia Regina Aires, 47 anos, dona de uma banca no local há oito anos. “A feira é o meu ganha-pão, é tudo para mim. Criei meus três filhos graças a esse trabalho, vendendo folhagens e verduras que a gente produz e também de outros produtores da região”, diz.
Moradora de Vicente Pires há mais de uma década, Valdirene Ribeiro, 55 anos, confessa que tem uma queda por feiras. Ama o cheiro, a movimentação, o barulho e, claro, os produtos. “Morava em Ceilândia e quando mudei para cá fiquei preocupada, porque a feira de lá é fantástica”, confessa.
“Mas a de Vicente Pires, apesar de menor, consegue atender a população. Os produtos são excelentes e a variedade também. Passo aqui toda semana; no domingo, então, é sagrado”, admite Valdirene.