Superação inspira reabilitação de internados no Hospital de Apoio

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Encontro quinzenal aborda aspectos emocionais para a recuperação

“Todos nós somos capazes de nos superar”. A frase de incentivo é de Thamara Oliveira, que ficou tetraplégica aos 21 anos, depois de sofrer um acidente de carro. Mesmo com as dificuldades, revolta e tristeza, a vida continuou e prosperou. Oito meses depois da tragédia ela teve uma filha, que chamou de Vitória, símbolo da superação das suas dificuldades pessoais.

Hoje, com 28 anos, Thamara volta ao Hospital de Apoio de Brasília (HAB), onde ficou internada. Desta vez, para conversar com outros pacientes da unidade que estão na mesma situação em que ela já esteve antes. A iniciativa, criada pelos profissionais de saúde do hospital, reúne alguns dos que receberam alta para mostrar aos internados como a reabilitação é possível.

“Quando estava internada aqui, fui a essa mesma reunião e sei pelo que estão passando. Na época, ouvi dos que tiveram alta como eles conseguiram seguir com a vida, ter filhos. Agora, estou aqui desse lado, com minha família, e sei como é importante mostrar que todos nós podemos seguir em frente”, conta Thamara, que estava acompanhada da mãe, da irmã e da filha.

As reuniões feitas entre os internados e os que receberam alta ocorrem quinzenalmente, no Hospital de Apoio de Brasília, organizadas pelos profissionais de saúde que atuam na unidade. Normalmente, os pacientes são oriundos de hospitais da rede pública que atendem trauma. As vagas são ofertadas por meio do Complexo Regulador da Secretaria de Saúde.

O servidor público Franklin Leite, 36 anos, também foi convidado pela equipe do HAB a dar seu depoimento. Ele tinha apenas 27 anos quando ficou tetraplégico.

Vindo de São Paulo, decidiu aproveitar as férias da faculdade e visitar a família em Brasília, mas levou um tiro durante uma festa. A revolta com a situação marcou seus primeiros anos após o acidente, mesmo quando ex-pacientes falavam com ele sobre a reabilitação.

MUDANÇA – “Nossa vida muda totalmente. É um mundo desconhecido, que assusta. Não aceitava de jeito nenhum e achava que eu não ia durar dois anos. Mas tudo isso é fase. Passa o tempo e você descobre que não morre, a não ser que você queira”, relatou Franklin.

“O primeiro passo para seguir adiante é pensar positivo e as coisas melhoram. Repensei a vida, decidi estudar, virei servidor e segui a vida. Penso que há males que vêm para o bem”, ressaltou.

No seu caso, um benefício que a vida trouxe após o acidente foi conhecer, pelas redes sociais, a venezuelana Jenifer, com quem se casou e teve o pequeno Luciano, hoje com dois anos. Para ele, agradecer pelo que tem faz parte do processo de reabilitação.

“Precisamos ter fé e dar valor ao que temos. Minha esposa é venezuelana e veio de uma realidade totalmente diferente agora, onde as pessoas não têm o que comer, nem serviço médico. Ela fica admirada com o que temos. Então, se aprendermos a dar valor, já podemos tocar em frente, porque sempre vai melhorando mais”, assegurou.

No caso do jardineiro Fredison de Souza, 44 anos, a visita dos ex-pacientes é importante para ensinar sobre as mudanças que a vida de um cadeirante exige. Vítima de um tumor nos ossos, está há três meses internado no HAB aprendendo a lidar com a situação. “Ouvi-los me fortalece, para não desanimar nesse começo. O Franklin mesmo teve esposa, filho, uma vida normal depois do acidente. Ele não deixou nada abatê-lo. Isso é muito legal e me inspira”.

ABORDAGEM – Segundo a médica fisiatra Celi Alves, uma das responsáveis por introduzir essa abordagem entre os pacientes, apesar de o serviço ser pouco conhecido na rede pública, é essencial para trabalhar aspectos emocionais e motores dos internados.

Na reunião, é possível até tirar dúvidas dos cadeirantes “novatos”. Entre elas, a questão das lesões por pressão, mais conhecidas como escaras, comuns em pessoas que ficam muito tempo na mesma posição.

“Os pacientes que estão entrando agora veem que é possível se reabilitar integralmente. Nosso objetivo é que os outros se sintam reforçados na questão da reabilitação, e também mostrar que podem superar as dificuldades, porque qualquer um pode fazer isso”, garantiu Celi.

CONQUISTA – Um dos pacientes que está determinado a conquistar a tão sonhada reabilitação é o servidor público José Eneriton, 39 anos. Há cinco meses no HAB, ele chegou à unidade totalmente paralisado. A causa foi a síndrome de Guillain Barré, um distúrbio autoimune – quando o sistema imunológico ataca parte do sistema nervoso do próprio organismo.

Com a fisioterapia, conseguiu, nesses poucos meses, recuperar boa parte da mobilidade. Já mexe a cabeça, braços, mãos e parte do tronco. Seu pai, sempre que pode, está presente às sessões. Nesse tempo, José garante que só tem a agradecer aos profissionais que o acompanham em sua recuperação.

“É um trabalho lindo e tão humano, feito com muita empatia, que melhora a nossa qualidade de vida. Há cinco meses estou na rede pública e, até hoje, graças a Deus, não me faltou nada”, elogiou. “E para aqueles que ainda não foram para casa, recomendo muito, pois a família nos fortalece demais”, completou José.

FAMÍLIA – A reunião foi conduzida pelas assistentes sociais do HAB Marta Paiva e Graça Wohlgemuth. Na ocasião, elas ressaltaram que a presença da família, nos encontros e na vida dos pacientes, é um fator determinante para a recuperação deles. “É importante a família estar junto para enfrentar a situação. Isso afeta a todos que estão próximos, mudando suas rotinas”, ponderou Graça.

Além disso, Wohlgemuth destacou que o vínculo entre a equipe e os pacientes não termina depois que eles recebem a alta, o que ajuda no caso dos pacientes que não possuem família. O acompanhamento continua ao longo do tempo, sempre que for preciso.

“Não há abandono.  Damos continuidade ao atendimento e isso garante uma segurança a mais. A equipe trabalha em prol da reabilitação”, frisou.

Na avaliação do diretor-geral do HAB, Alexandre Lyra, o sucesso da reabilitação também se deve à atuação da equipe. “Temos boa vontade, amor pelos pacientes e todos aqui estão voltados para o que for melhor para eles. Olhamos o paciente como um todo”, concluiu.

Leandro Cipriano, da Agência Saúde

Fotos: Mariana Raphael/Saúde-DF​